1. A novela da "Menina dos Rouxinóis", intercalada nas "Viagens..."
Resumo e linhas de significação.
Leitura de excertos do livro e de um texto de apoio ( J. Tomaz Ferreira) [ver mais abaixo]
2 . O abandono e desleixo a que está sujeito o Património monumental em Portugal. Ver cap. XXXIX
e XLII das Viagens...
Ver também:
http://aorodardotempo.blogspot.pt/2010/11/imagens-do-meu-olhar-o-tumulo-do-rei-d.html
Leitura de algumas passagens das Viagens dos cap. referidos, acompanhadas de imagens
ilustrativas (PPoint)
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TEXTO DE APOIO
VIAGENS NA MINHA TERRA
A NOVELA DA MENINA DOS ROUXINÓIS
Na casa do Vale vivera uma família de que
eram membros Carlos e Joaninha. Primos, ambos foram criados pela avó que tivera
a desdita de perder não só a filha, mãe de Carlos, mas também o filho, pai de Joaninha, e o genro, marido da filha.
Na família, e em particular no que dizia respeito a Carlos, tinha grande
ascendente Frei Dinis, um homem que, depois de ter sido grande no mundo,
abraçara a religião e doara àquela família os seus bens. Frei Dinis visitava a
família todas as sextas-feiras e mantinha com a velha avó uma estranha
relação de tutela. Todo afeito às ideias absolutistas, não conseguiu evitar que
Carlos, cuja antipatia por ele era manifesta, emigrasse para Inglaterra para
se juntar às tropas liberais. É por ocasião da chegada, trazida por Frei Dinis,
de uma carta de Carlos para Joaninha, que Frei Dinis tem com a avó desta uma
estranha e longa conversa de que nasce na velha um choro que provoca a
cegueira.
Entretanto,
com os sucessos da guerra civil, acontece que Carlos regressa ao Vale, onde
reencontra Joaninha. Esta ama o primo e esperara por ele; este sabe que a ama
também, mas reconhece que não era digno daquele amor, pois se ligara a outra
mulher. Joaninha tudo adivinha e põe termo ao devaneio.
Numa
dura batalha, Carlos é ferido gravemente. Quando volta a si, encontra-se numa cela do convento de Frei Dinis. Ali
depara com Georgina, a inglesa que o amava e que, nobremente, o trata, reconhecendo
embora que o coração dele pertencia a Joaninha, razão que a leva a romper com
ele. Mas, pior do que isso, ali toma Carlos conhecimento de que afinal é filho
de Frei Dinis, o homem que, antes de entrar em religião, amara adulterinamente
sua mãe, lhe matara o marido e o pai de Joaninha também.
Na
sequência de todas estas revelações, Carlos desaparece. Não matara o frade,
como era sua intenção, antes acabara por lhe conceder o seu perdão. Mas a
maldição abate-se, sob a forma de morte, sobre as personagens
desta história: Joaninha enlouquece e morre; Georgina converte-se ao catolicismo e morre para o mundo
entrando em religião; a avó enlouquece e sofre assim a morte da razão; Carlos
sofre a morte moral do homem com ideais que se transforma em agiota: «morreu-lhe o coração para todo o afecto generoso e deu
em homem político e agiota» (cap. XXXVI). Só Frei Dinis continua no mundo como
figura de tragédia que a morte parece repelir até que expie no sofrimento os
seus pecados.
***
Como vemos, o romance compreende duas
histórias que se entrecruzam, cada uma delas com o seu protagonista bem
definido. Uma é a história de Frei Dinis. As suas ideias passadistas, a sua
condição de frade bem podiam apontá-lo como o símbolo do regime derrubado. E
esse regime ele encarna-o na ideologia que defende e na veemência
com que se opõe ao avanço das novas ideias. Não se pense, porém, que tinha sido
ideia de Garrett desenvolver o fio da história por esta linha simbólica.
A história de Frei Dinis configura uma
tragédia humana e é um pouco ao ritmo da tragédia grega que ela se desenrola,
não faltando sequer o «Coro» que Frei Dinis de certo modo interpreta ao comentar
os acontecimentos e ao prevê-los. O papel simbólico da história funcionará
mais como nas parábolas, não no paralelismo que passo a passo se podia
estabelecer com o real, mas no significado que da globalidade da história se
desprende. É aqui que o passo crucial estará situado, no momento em que o
herói da ordem nova, Carlos, ao aprestar-se para matar o representante da
antiga, se apercebe de que, afinal, ia matar o próprio pai. É como sabemos, a
repetição duma situação que Garrett já explorara em O Arco de Santana.
Carlos, por seu lado, protagoniza a outra
história, aquela que envolve a primeira e que, por isso mesmo, assume a
categoria de principal. Carlos é um herói romântico e é uma história romântica
o que ele protagoniza: a história dum amor desfeito pela excessiva capacidade
de amar que o protagonista revela. Carlos ama Joaninha, mas ama simultaneamente
Georgina: «Oh,
Georgina, Georgina, I love you still» (cap. XXXII). Como já amara Laura, e depois
dela Júlia. E a todas amara sinceramente. O resultado de tantos amores, fruto
de tanto amor, foi uma sementeira de desgraças que em parte já referimos.
Mas Carlos, se é o herói romântico, é também
a projecção literária do próprio Garrett. Não deixará de ser sintomático a este
propósito, a nota autobiográfica que o Autor deixa cair no cap. XI, exactamente
a anteceder a história da «Menina dos Rouxinóis»: «...eu, que já não tenho que
amar neste mundo senão uma saudade e uma esperança — um filho no berço e uma mulher na cova?... [...] E
posto que hoje, faz hoje um mês, em tal dia como hoje, dia para sempre
assinalado na minha vida, me apareceu uma visão, uma visão celeste que me
surpreendeu a alma por um modo novo e estranho.»
Há aqui uma referência clara a Adelaide
Deville Pastor e à filha que lhe deixou; como há, depois, a referência a Rosa
Montufar Infante, a «visão celeste» que voltou a despertar-lhe o coração que devera antes devotar-se ao culto duma saudade e à cura duma esperança. Porque
também o coração de Garrett era grande de mais — como o de Carlos (cf. cap.
XXXVI).
A
ser assim, teremos Garrett, como Carlos, a fazer a sua auto-análise de herói
romântico, a reconhecer as suas mazelas e a assumi-las como se delas pudesse e
devesse tirar glória. «Oh! eu sou um monstro, um aleijão moral, deveras, ou não
sei o que sou» (cap. XLVI), exclama.
Mas a que se deve a monstruosidade? «Deus que me castigue se ousa fazer uma
injustiça, porque eu não me fiz o que sou; não me talhei a minha sorte, e a
fatalidade que me persegue não é obra minha.»
Assim, pois, na história de Carlos há ainda um duplo
drama: aquele que Ioda a gente vê e se traduz nos resultados que enumerámos, e
o drama oculto que se passa no íntimo do personagem — o drama psicológico duma
natureza que se analisa e sofre com o que vai ser, contraposto ao que gostaria
de ser: «Eu sim, tinha nascido para gozar as doçuras da paz e da felicidade
doméstica; fui criado, estou certo, para a glória tranquila, para as delícias
modestas de um bom pai de famílias.» (Cap. XLVIII)
In:
Nota Introdutória de J. Tomaz Ferreira,
VIAGENS
NA MINHA TERRA, A. Garrett,
Livros
de bolso Europa-América, 7ª ed.,
Mem
Martins, 1999
A obra de Garrett ,um dos geniais da literatura, sempre apaixonante.
ResponderEliminarO título "Viagens na minha Terra " é prenúncio de impressões sentimentais como a de Joaninha_'a menina dos rouxinois' e do heroi Carlos.
Muito bem o texto ,
Obrigado pela tua visita, Lis.
ResponderEliminarVolta sempre.
Saudações